Aline Oliveira
Ao longo dos séculos, a Holanda desenvolveu uma arquitetura singular e distintamente protestante, enraizada em sua natureza doméstica e pragmática. A arquitetura holandesa do século XVII é uma ode à elegância discreta, adaptada a um país de topografia suave. A escassez de hierarquia arquitetônica e a ausência da exuberância barroca encontrada em países católicos do sul criaram um estilo sóbrio e atraente, onde as pilastras planas e os tijolos simples eram a norma.
Essa simplicidade, no entanto, não surgiu apenas de um temperamento calmo e de uma religião iconoclasta, mas também das limitações de materiais. Os tijolos eram e continuam sendo o principal material de construção na Holanda. Apesar disso, as igrejas barrocas de Hendrik de Keyser e Jacob van Campen incorporaram elementos decorativos em suas agulhas, criando um efeito que influenciaria até mesmo a arquitetura da cidade de Londres.
O caráter doméstico é a essência dessa arquitetura holandesa. As casas são luminosas e arejadas, antecipando o conceito moderno de casas de família bem organizadas e limpas. Pintores contemporâneos, como Vermeer, capturaram e até idealizaram esses espaços domésticos, moldando nossa percepção do idílio familiar.
A influência holandesa transcendeu fronteiras, refletindo-se na arquitetura colonial nos Estados Unidos e deixando uma marca profunda e duradoura na América do Sul. No estado de Nova Jersey, casas no estilo holandês como a Abraham Ackerian House remontam a 1704, lembrando a conexão histórica. Na África do Sul, o estilo colonial holandês ganhou vida no Cabo a partir de 1679, dando origem a belas casas de fazenda brancas, muitas delas localizadas nos renomados vinhedos de Stellenbosch. A simplicidade e a luminosidade dessas casas as tornam atemporais e modernas até hoje.
Além disso, o estilo holandês encontrou uma fusão harmoniosa com o palladianismo, como demonstrado pelas obras de Jacob van Campen, como a Mauritshuis em Haia, que ecoam na clássica casa georgiana com terraço. Essa mistura de estilos criou um novo padrão de moradia urbana, que serviu de inspiração para muitos projetos subsequentes.
Na Bélgica, uma tradição mais exuberante se manifestou nas fachadas esculpidas das casas barrocas em Bruxelas, que lembram a riqueza das artes de renda e confeitaria do país. Esses edifícios são como caixas de bombons arquitetônicos, um testemunho da habilidade artística belga.
Em suma, a arquitetura doméstica holandesa do século XVII transcendeu sua época e lugar, deixando uma marca indelével na forma como entendemos a beleza, a funcionalidade e a harmonia na arquitetura residencial. Sua elegância discreta e caráter doméstico continuam a nos inspirar, transformando a casa em um verdadeiro idílio de conforto e estética.
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Fonte:
GLANCEY, Jonathan. The Story of Architecture. London: Dorling Kindersley, 2000.
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